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RAMOS, Benedito. O tesouro da Associação Comercial de Maceió. Tribuna Independente. Maceió, 29 jan.2012. Contexto.
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Um pequeno bilhete sobre um acervo documental
Continuamos divulgando matéria
sobre o acervo da Associação Comercial de Maceió e, desta feita, Contexto fala
da documentação que ela dispõe sobre a vida alagoana, boa fonte de pesquisa e
que vem sendo colocada, paulatinamente, à disposição pública. Seria
interessante que as organizações em Alagoas se habituassem a tratar daquilo que
é importante para a sua história e para a da sociedade. A Associação Comercial de Maceió vem dando um
exemplo com relação ao assunto e mantendo a sua posição orgânica dentro do que se costumou a identificar como
classes produtoras.
Benedito Ramos é um dedicado
gestor cultural, sendo responsável pela organização e manutenção do arquivo da
Associação que é presidida por José Geminiano Acioli Jurema. No fundo,
atualmente, a Associação representa com maior ênfase a pequena e média empresas, integrando-se a
outras unidades municipais dentro de uma Federação também presidida por José Geminiano.
Sávio de Almeida
Cine Delícia. Aqui foi criada a Associação Comercial |
Jornal
de Alagoas de 17 de Julho de 1928
A festa supimpa |
O Palácio do Commercio
illuminou-se como para uma apparição phantastica de sonho de Sherezade. Para
elle, logo as vinte horas, começaram a correr conduzindo a nossa sociedade
elegante e requintada em toilletes riquíssimas, todos os automóveis da capital
e algumas dezenas de outros que vieram do interior do estado. As escadarias de
mármore espalhavam as gambiarras das gigantescas cortinas luminosas que cahiam
do frontão da alta columnata. Através dos vitrais de colorido e rendilhado
oriental era um incêndio nababesco de imprevistas irradiações cambiantes. E as
musicas militares tocam no vasto hall, onde os primeiros criados ostentavam as
suas fardas verdes cheias de alamares dourados.Mas la por cima o luxo se
multiplicava em luzes tantas em tão custosos móveis e em tamanhos adornos de
alfaias e tapeçarias, que dir-se-ia o alcazar ou o alhambra, de quaesquer das
grandes cidades meridionaes da Peninsula Iberica ao tempo da invasão mourisca: a impressão era
de que estavamos num imenso salão de embaxadores, onde as próprias paredes, pela
suave tonalidade dos reflexos era de porcellana a mais fina.
Os serviços, fidalgos, como jamais
melhores.
Tres grandes orchestras que se
revesavam initerruptamente faziam a delicia dos bailados. E os outros
creados impeccaveis na sua indumentaria
e disciplina a todo instante passavam com as bandejas largas de prata pezadas
de bebidas finas e de doces raros.
Desejariamos, para completar esta
reportagem que infelizmente não podemos lançar a altura do acontecimento,
referir uma lista de assistencia.
Mas o que é que ha de mais
em destaque em Maceio, na administração do estado, no corpo consular, nos
serviços federaes aqui installados e na organisação da edilidade que ali não
estavam, ostentando a linhas das casacas irrepreenciveis de permeio com as
fardas dos militares mais graduados e as toilettes de rigor das damas mais
respeitaveis e das senhorinhas mais famosas e gentis de nossa sociedade
Acta da quarta Assembleia Geral da
AssoCiação Comercial de Maceió 17 de Agosto de 1868
Presidencia do Sr. G. W. Wucherer
As
doze horas do dia assumio o Snr. Presidente a cadeira e procedeo o secretario a
chamada e verificou-se achar-se presente o nº de vinte e trez assionistas, e
por tanto declarou o Snr. Presidente continuada a Assembleia Geral; pelo que,
expor que se havia a tractar da mudança do salão desta associação para Jaraguá,
fim para que havia sido convocada desta assembleia, visto que se havia por
tanto essa mudança na ultima Assembleia Geral, quando a direcção de semelhante
proposta para esta Assembleia, e portanto que hia por a votação e discução a
mudança do dito salao, por (____?____) secreto e devendo os Snres. assionistas
que fossem do parecer que o salao ficasse em Maceió depositaram na urna essa
palavra, e os que fossem de parecer que devia se mudar para Jaraguá
depositassem a palavra Jaraguá, prossedida a votação, foi verificando que forao
depozitados na urna dez bilhetes com a palavra Jaraguá e treze com a palavra
Maceió, ficando consigentemente aprovado que a dita sala continuará a
permanecer em Maceió. E por ficar assim rezolvido Eu Candido Venancio dos
Santos, secretario lavrei a presente Acta na qual assignei com o Snr.
Presidente e mais assionistas Presentes:
G.
W. Wucherer
Presidente
Candido
Venancio dos Santos
-
Secretario
Manoel
Martins de Vasconcellos
Director
José
Virginio T. de Araujo
director
João
Antonio Monteiro
Acta Quinta D’Assembleia Geral
extraordinaria da Associação Commercial de Maceió em 6 de Junho de 1869.
Servindo de Presidente o secretario da
mesma Candido Venancio dos Santos
As onze horas do dia acima assumio a cadeira da
presidencia o secretario Candido Venancio dos Santos, por não haver comparecido
o presidente nem o vice presidente, e
sendo este o terceiro dia para o qual se tem convocado a presente Assembleia
extraordinaria, e podendo portanto julgar-se a mesma constituida com o numero
dos socios presentes na forma do art. 26 do estatuto que rege essa Associação,
declarou o Secretario servindo de Presidente aberta a sessão. Verificou-se
acharem-se presentes os Snres socios, Thesoureiro João d’Almeida Monteiro, Manoel
de Vasconcellos Junior, José Joaquim de Oliveira, Vasconcellos e Moraes, Borstelmann e cia,
Vasconcellos Barboza e Torres, Joaquim
de Souza Ferreira, Antonio Teixeira de 2Aguiar e o Secretario Candido Venancio
dos Santos.
O Secretario servindo de presidente; passou a ler a
exposição seguinte:
- Senhores – Cumpre
dar vos a razão para que foste
convidados para esta reuniao da Assembleia Geral extraordinaria, foi pela mesma
que é o Medico a caza do infermo, isso
é, para que cure o mal que ameassa a nossa comparação. Antes porem d’apresentar
vos qual
seja
o mal de que vos venho falar, cumpre dizer vos alguma cura, afim de que vos,
compenetrados da importancia d’um estabelecimento dessa ordem cursis com zello
a sua conservação. A nossa Associação, é o vinculo que representa o nosso
commercio, qual quer reclamação em suplica enderessada ao governo (__?___),
seus delegados por intermedio della, tem incontestavelmente mais força e
prestigio do que sendo enderessada individualmente, visto que o que parte de
uma Associação é expressão de um corpo colectivo, e quando imensas outras
utilidades não houvessem essa só bastaria para cultuar em vosso espirito, que
axas esclarecido comprehenderá milhormente a importancia e utilidade desta
comparação, do que eu o poderia explicar, portanto não proseguireis em vol-a
demonstrar.
Quanto ao mal que vai solavando a nossa Associação, passo
a vol-a apontar. Snres sabis que nenhum estabelecimento se poderá manter, sem que
a sua receita (___?____) as suas despezas, e quando essas excedem a quella,
duplicadamente, nenhum equilibrio sera pussivel. É esse o estado presente de nossa Associação.
De cento e tantos socios com quem contavamos, resta-nos apenas o limitado
numero de vinte e tantos que contribuem regularmente com suas mensalidades.
Reduzinda a receita mensal a quarenta e tantos mil reis, para fazer face as
despezas de trinta do aluguel d’uma caza, quarenta de ordenado de um caixeiro, assignaturas dos
jornaes da capital, Rio de Janeiro,
Pernambuco e Bahia, coloca este estabelecimento
em circunstancias de serem precisas medidas acertadas para a
conservação de sua existencia. É pois para que cureis de semelhante estado que
foste convidado para essa reunião.
Snres, a Associação commercial de Maceió, não deverá continuar
dessa forma deixal-a baquear por falta de recursos de que podeis dispor, seria
alem de que um cazo inteiramente virgem, um grande dezar para o nosso
commercio, cuja a ideia somente seria bastante para vos emvergonhar. A nossa
Associação devidamente fundada com licença do governo Geral, não deve ser
considerada como uma sala de dança de mininos, que cai por qualquer leviandade,
não, ella devera ser mantida e conservada a todo custo, sendo que sejao
necessarios sacrificios [...]
O TESOURO DA ASSOCIAÇÃO COMERCIAL DE MACEIÓ
Benedito
Ramos
São as dimensões superlativas do Palácio do
Comércio, sede da Associação Comercial de Maceió, desde 1928, que traduzem o
sentido da riqueza consoante ao aparente fausto. O fausto que se celebra no
instante de sua inauguração, capaz de inebriar o jornalista que divulgou a matéria no dia seguinte,
domingo, 17 de julho de 1928, no Jornal de Alagoas. A empolgação do cronista, ainda hoje, reflete o panorama social
e econômico da capital alagoana. Foi o apogeu do comércio que permitiu a
construção de um prédio de 3.589 m² no mais insinuante estilo neoclássico
tardio. Mas depois de 83 anos, o Palácio do Comércio, inaugurado pomposamente naquela
noite memorável, já foi restaurado uma vez e, mesmo assim continua a exibir sem
pudor algum, as mesmas marcas do tempo que o degrada. A Associação Comercial de
Maceió possui uma imensurável riqueza materializada em documentos que não só
atestam sua própria história, como dos seus integrantes e mais ainda: da construção do próprio Estado de Alagoas.
Não seria demais dizer que o maior tesouro da entidade seja sua história.
REGISTROS
PRESERVADOS
Manter
145 anos de história, desmontada como peças de um quebra-cabeça, que se
completa agora página a página, em seus 11 livros de atas pode parecer linear
ao pesquisador, caso esta história não se intercalasse nos apontamentos dos
Livros de Matrículas dos sócios, nos convênios para fiscalização do algodão e do
açúcar, na coleção de telegramas trocados com a Inglaterra e mais uma dezena de
livros de estatísticas da movimentação portuária. Mais ainda, se o pesquisador
for buscar informações nas Fallas da
Província. Coincidentemente muitas informações destes relatórios se repetem
nas atas da Associação e em alguns casos são representações da entidade junto
ao governo, como pedidos para a construção das Pontes de Embarque e do Riacho
Maceió, ligando Jaraguá a capital, implantação de linha ferroviária e estradas
para escoamento da produção. A partir da República esta relação irá aparecer na
coleção de leis e decretos do governo, até 1946, que faz parte do acervo do
Museu do Comércio de Alagoas.
Os
livros de atas iniciam em 22 de julho de 1866, quando os comerciantes se
reuniram para fundar a Associação Comercial de Maceió, mas curiosamente, um
convênio para fiscalização de toda a logística algodoeira foi firmado no mesmo
dia, e mesmo antes de oficialmente existir uma associação. Razão pela qual
estes dois livros se intercalam com as atas das reuniões da chamada Junta de
Direção. Diferente das Atas de Assembleias, realizadas ordinariamente todo ano
ou extraordinárias a qualquer tempo, o fato é que estes documentos revelam seu
cotidiano, assim como seus atores principais, aqueles diretamente ligados ao
comércio de algodão. Pelo menos no princípio era assim. E, praticamente, nos
doze primeiros anos de sua existência a Associação exerceu uma marcação segura
em cima deste mercado.
E,
só mais tarde vamos ver os produtores de açúcar criando o mesmo sistema. O que
não impede, apesar dos cuidados, alguns registros de fraudes, inclusive com
pagamento de multas pelo preposto da entidade. E, diga-se de passagem, que as
multas eram recolhidas ao Hospital da Caridade e não a nenhum beneficiário do
convênio, inclusive sua interveniente, a Associação Comercial de Maceió. Em
tudo isso é importante ressaltar, já naquela época, o avanço na sistematização
da logística algodoeira, ministrada pelo teor de tais convênios, que mais tarde
veio completar-se com a presença de uma comissão, formada pelos próprios
consócios, todos do mesmo ramo, que analisavam cada situação nova, inclusive a
qualidade do produto, para assim, num colegiado, decidirem o melhor.
Indubitavelmente,
um livro que nos chama a atenção: é o Registro de Matrícula dos Sócios, que
como qualquer outro, no gênero, ele elenca os participantes da entidade desde
seu ingresso e assinala inclusive, a sua saída, seja por razão pessoal,
estatutária ou por falecimento. Neste ultimo caso, não encontramos em nenhum
momento, alguma nota de pesar, ou qualquer outra informação além da expressão:
“falecido” e em alguns casos a data. Esta regra parece abranger a todos, sem
distinção, a ponto do próprio fundador passar incólume numa lista coletiva sem
outra anotação, além de “falecido”.
Os
telegramas, mas do que qualquer outro documento, enseja a relação da província,
a partir de 1874, com o restante do mundo. Sua utilização é o que se apresenta
de mais avançado para o terceiro quartel do século XIX. Isto porque além das
informações dos mercados do algodão, açúcar e outros gêneros, com as devidas
cotações de preço, o texto se expande tratando dos principais acontecimentos
políticos, sociais e econômicos do Brasil, das Américas, da Europa e do restante
do mundo. O serviço de telégrafo funcionava como um correspondente no exterior
trazendo as principais notícias, entre
aquelas que teriam algum reflexo no mercado. Outro detalhe importante
para o mercado era a posição dos navios cargueiros e os portos onde estavam
atracados. Isto permitia cada praça vislumbrar uma previsão de remessa das
mercadorias nos trapiches, ou de recebimento das importações.
Levando-se em consideração que a
implantação do sistema telegráfico no Brasil iniciou em 1852, o aproveitamento
dessa forma de comunicação à distância teve bastante efeito no comércio para o
exterior, chegando, inclusive, a criar uma linguagem própria traduzindo o humor
do mercado. Algumas expressões como: mercado
frouxo, Assucar quieto, mercado firme, mercado calmo, algodão calmo, algodão
bastante animado, mercado em férias, aparecem com frequência deixando
evidente que este tipo de comunicação, rapidamente, havia se adaptado ao
colóquio das bolsas de mercadorias.
Quanto ao que poderíamos chamar de
noticiário, este evidencia os acontecimentos mais importantes, enfatizando o
país de origem, sem fazer distinção
entre as informações do mercado, como podemos ver no texto datado de 27 de
outubro de 1874.
Devemos lembrar que quando da
implantação do telégrafo em Maceió, a Associação chegou a solicitar a
instalação de um aparelho em sua sede, o que nos parece foi, parcialmente,
atendido quando o local escolhido ficou o endereço da Rua Sá e Albuquerque, ali
permanecendo durante 45 anos.
O
RESGATE DA HISTÓRIA
Entre
os seus 145 anos de existência da Associação Comercial de Maceió e 83 da
construção de sua sede o Palácio do Comércio, passaram 31 presidentes, desde
José Joaquim de Oliveira até José Geminiano Acioli Jurema, muita documentação
envelheceu e se perdeu. Mesmo assim o que restou ainda é uma preciosidade. Os
primeiros livros de atas, nem todas as entidades do gênero, contemporâneas ou
precedentes possuem. Com os demais documentos nos debruçamos sobre a memorável
história da instituição, que mesmo assim permanecia obscura, na sua escrita
antiga e rebuscada, desde os idos de 1866. Foi graças a uma pareceria com a
BRASKEM e um convênio com a Universidade Federal de Alagoas que iniciamos a
transcrição paleográfica destes documentos. O trabalho iniciou há um ano e meio
com a contratação de duas estagiárias do curso de História e ainda deve
perdurar por mais dois anos.
T odo
o material transcrito até agora já está digitado e disponível ao pesquisador através do site: https://sites.google.com/site/mucomal/
assim como pode ser fornecido ao pesquisador, diretamente na Coordenadoria de
Ação Cultural e Social da Associação, no Palácio do Comércio.
A
metodologia utilizada na transcrição permite ao pesquisador confrontar o texto
transcrito com o livro original, em caso de dúvida. A transcrição marcada linha
a linha com o número da respectiva página oferece maior credibilidade ao
documento transcrito. E por sua vez a transcrição seja impressa ou digital
evita que o pesquisador toque os livros originais que são manuseados com luvas.
É
transcrição desta documentação, juntamente com as pesquisas até agora
empreendidas e difundidas pela entidade colocam o Palácio do Comércio num lugar
de destaque na preservação da História Econômica de Alagoas. E, com certeza
nenhuma obra no gênero estará completa se esta bibliografia documental não
fizer parte da pesquisa. Afinal, não há como negar que o desenvolvimento do
Estado tenha passado soberbamente pelos trapiches do bairro de Jaraguá. E, sem
dúvida alguma a ancestralidade do associativismo nas Alagoas promoveu uma
parceria entre a iniciativa privada e o Governo Estadual. A Associação
Comercial de Maceió, esteve ativa e presente quando nenhuma estrutura aduaneira
existia e assim permaneceu até quando o governo provincial preencheu esta
lacuna. Hoje, após este trabalho, que apenas se inicia é possível dizer e
comprovar esta tese de que a iniciativa privada foi gestora do seu destino
econômico e fazendo com que o capital mercantil prosperasse a ponto de se
construir um Palácio no gênero da sede da Associação Comercial de Maceió.
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