PERDIGÃO, Lautheney. Depoimento para a história: Bastinho, um cartola diferente. Tribuna Independente. Maceio, 8 abr. 2012. Contexto.
DEPOIMENTO PARA A HISTÓRIA: Bastinho, um cartola diferente
Lautheney Perdigão
José Sebastião Bastos, o Bastinho,
nasceu na cidade de Fernão Velho no dias 12 de setembro de 1922. Casado com
dona Gerba teve uma filha, Maria Dorotéia e um garoto Daniel que criava como
seu afilhado. Formado na Faculdade de Direito de Alagoas, passou a maior parte
de sua vida dedicada ao esporte, em particular, o futebol. Depois de ocupar
vários cargos na Federação Alagoana de Desportos, foi eleito, pela primeira
vez, presidente da entidade e ficou por dez anos. Tempos depois conseguiu voltar
a dirigir o futebol, agora na Federação Alagoana de Futebol.
Bastinho e Aldo Ivo |
Na vida deste nosso personagem
aconteceram coisas incríveis. Foi presidente da Federação Alagoana de Desportos
sem nunca ter chutado uma bola. Foi comandante da Guarda Civil sem ter sido
militar. Foi Diretor Administrativo do Serviço de Engenharia do Estado sem
nunca ter sido engenheiro. Foi presidente da Colônia de Pescadores sem nunca
ter lançado um anzol no m ar. Também, foi Vereador, Diretor do Serviço de
Patrimônio do Estado. Dirigiu o Departamento de Educação Administrativo da
Codeal. Chefe de Gabinete das Secretarias do Planejamento, Educação, Indústria
e Comercio. Vice–Presidente da Confederação Brasileira de Futebol. Aposentou-se
como Consultor jurídico do Estado.
Bastinho é o desportista que mais
tempo ocupou a presidência da Federação Alagoana de Futebol. Ele está na
pequena lista dos dirigentes que são mais respeitados e admirados por todos.
Nos momentos mais difíceis do nosso futebol, Bastinho estava sempre presente
para servir de mediador. Muitas vezes teve que participar de reuniões com
dirigentes dos tradicionais CRB e CSA e, com seus argumentos, reatar os laços
de amizade entre os dois clubes. Era antes de tudo, um conselheiro. Sempre
procurando os caminhos certos que são orientados por leis e regulamentos.
Na década de cinqüenta Carlos de
Miranda, que era Presidente do Tribunal de Justiça Desportiva, convidou
Bastinho para ser suplente do TJD. Seu nome foi levado à consideração da
Assembléia da Federação Alagoana de Futebol e aceito pelos clubes. A Federação,
na época, era eclética. Além do futebol, tinha futebol de salão, voleibol,
basquetebol, natação, xadrez, ciclismo e atletismo. Ficava num casarão na Praça
Sinimbú, onde hoje se encontra o Tribunal Regional Eleitoral. Um mês depois
Bastinho já era convocado para ser juiz efetivo em uma das vagas do TJD.
Começou a se interessar pela legislação esportiva e acompanhar o dia a dia da
Federação. Foi seu primeiro passo no esporte alagoano.
Bastinho, Havelange, Renan Rosas |
Em 1958, Ulisses Marinho que era o
Vice-Presidente da Federação Alagoana de Desportos, foi convidado para ser
Presidente do Esporte Clube Alagoas e deixou vago o cargo. Eraldo Calado,
Diretor do Centro Sportivo Alagoano, indicou seu nome junto à Assembléia dos
clubes para substituir Ulisses Marinho. O Presidente, Major Kleber Rodrigues,
concordou e os clubes também. A subida foi rápida. No ano seguinte, o Major
Kleber foi transferido para uma Guarnição Federal no Piauí. Bastinho assumiu a
Presidência pela primeira vez. Em dezembro daquele ano foi candidato e eleito o
novo Presidente da Federação Alagoana de Desportos. Ele não se esquece de
muitos desportistas que conheceu no inicio dessa caminhada. Nomes que eram
respeitados pela contribuição que davam ao esporte alagoano: Alexandre Dantas,
Jair Galvão, Almachio de Oliveira Costa, do TJD, eram homens justos. José
Crispim, grande amigo de Bastinho, foi seu Vice-Presidente até 1968, quando ele
deixou a Federação pela primeira vez.
E foi no seu ultimo ano como
Presidente da Entidade que Bastinho teve que resolver um caso Capelense e
Penedense. Depois de estudar o caso teve que decidir e, consciente, deu ganho
de causa ao Capelense. Foi a primeira vez que um clube ficou contra Bastinho.
Dirigentes do Penedense, inconformados, fizeram campanha apresentando o
Presidente da Federação como inimigo dos clubes do interior. O que não era
verdade. Nas gestões do Bastinho, passaram a participar dos campeonatos
alagoanos os clubes interioranos com Capelense de Capela, ASA de Arapiraca, Rio
Branco de Massagueira, CSE de Palmeira dos Índios e o próprio Penedense de
Penedo. Nessa campanha, o CRB indicou o nome de Remi Maia, de Palmeira dos
Índios, para Presidência da Federação. Bastinho perdeu sua primeira eleição.
Entretanto, o tempo passou, ele ficou um pouco afastado da entidade, mas depois
voltou a se candidatar e ganhou outras três eleições. Voltou a Presidência da
Federação de 1985 a 1988 e 1991 a 1995 e no último mandato ficaria até 1999.
Quando foi eleito um dos cinco Vice-Presidentes da Confederação Brasileira de
Futebol, entregou o cargo para Raimundo Tavares, seu Vice-Presidente.
Bastinho, Havelange, Nilo Floriano Peixoto |
Em 1966 aconteceu um fato que
Bastinho gosta de relembrar. O Departamento de Árbitros era autônomo e dirigido
pelo competente Moisés Silva. Na semana do clássico surgiu um problema. Nilo
Floriano, Presidente do CSA, e Severiano Gomes, Presidente do CRB, não chegaram
a um acordo para a escolha do arbitro da partida. Partiram para arbitro de
outro Estado. Também não houve acordo. Estava criado o impasse. Bastinho reuniu
Biano, Nilo e Moisés e colocou quinze árbitros alagoanos para um sorteio. O
Presidente do CRB impugnou Manoel Amaro. Bastinho não aceitou e no sorteio deu
Manoel Amaro. O CRB não compareceu a Pajuçara para enfrentar o CSA e perdeu os
pontos. Apesar dos protestos dos dirigentes alvirubros, o Presidente da Federação
se manteve firme. Entrou como apaziguador e tentou o equilíbrio. Como nado deu
certo, teve que usar de energia para fazer cumprir o regulamento. O Departamento
de Arbitro era autônomo e Bastinho ficou do lado do seu departamento.
Entre os muitos recordes do Bastinho
que Bastinho possui, um deles é imbatível. Ele é o único Presidente de
Federação de Futebol do Brasil a ser empossado numa sala de despachos de um
Palácio do Governo e com a presença de João Havelange, Presidente da FIFA.
Somente o prestigio, a amizade e tudo de bom que fez ao longo de sua caminhada
pelas estradas do esporte, fizeram com que Bastinho conseguisse realizar um
sonho acalentado há muitos anos. Uma posse de alto nível, com a presença de
muitas autoridades e o seu compadre Havelange.
A amizade com João Havelange começou
em 1959. Ele foi apresentado ao então presidente da CBD pelo Presidente da
Federação Pernambucana de Futebol Rubens Moreira. Ali se consolidou uma amizade
que se aprofundou entre as famílias e que perdurou até sua morte. João Havelange
é padrinho de Dorotéia, filha do Bastinho. Aliás, ela fez seu curso de inglês
na área de comunicação, na Suíça, onde está a sede da FIFA. Tudo patrocinado
pelo padrinho. E não foi uma fineza de empréstimo. Foi fineza de cordialidade,
de cavalheirismo, de fidalguia, de lealdade, de seriedade. Havelange não
precisava do voto do Bastinho, nem Bastinho era eleitor da Fifa.
José Sebastião Bastos
tinha na sua casa uma sala de troféus que faz inveja aos grandes
colecionadores. É o único Presidente de Federação que recebeu cinco bolas de
ouro. Comendas de Beneméritos da CBD, CBF e da Federação Pernambucana de
Futebol. Miniatura da Taça Jules Rimet conquistado no México e da Taça FIFA
ganha nos Estados Unidos. Diversos diplomas de Beneméritos das Federações do
Rio de Janeiro, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Espírito
Santo, Brasília e Associação Alagoana de Imprensa. Cidadão Honorário de
Arapiraca e Viçosa. Diplomas de bons serviços prestados ao esporte alagoano nos
governos de Afrânio Lages e Divaldo Suruagy. Diplomas da Confederação
Sul-Americana de Futebol pelos serviços prestados na Copa América em 1989.
Muitos troféus e medalhas, Além de chefiar duas delegações da seleção
brasileira de juniores que disputaram campeonatos Sul-Americano e mundial.
Entre as muitas homenagens que recebeu Bastinho sempre lembrava com carinho
daquela que teve no Museu dos Esportes no projeto Cantinho da Saudade.
Sua indicação para Vice-Presidente da
CBF partiu dos colegas Presidentes das lideradas pelos Estados do Nordeste.
José Clarivaldo de Souza, Presidente da Federação Sergipana foi seu principal
nome nessa indicação que foi seguida pelos demais dirigentes. Na Confederação
Brasileira de Futebol ele poderia ajudar mais o futebol alagoano. Antes,
Bastinho já tinha sido Diretor de Coordenação Regional da CBF. Era um relações
publicas entre os Presidentes das Federações e o presidente da CBF. Durante
dois anos esteve nesta função e realizou um excelente trabalho com os
Presidentes que integravam o colégio eleitoral. E ele não esconde que João
Havelange e Rubem Moreira foram os grandes dirigentes do futebol brasileiro. Rubens Rodrigues Moreira foi um líder pela
sua capacidade e lealdade. Rubem Moreira foi o amigo de todas as horas. Para
Bastinho João Havelange é um homem de porte universal. Mas em qualquer que
esteja ele sempre se lembrará o seu compadre. A amizade entre os dois nunca
teve um arranhão. Foram amigos para sempre.
Em 1967 José Sebastião Bastos,
Presidente da Federação Alagoana de Desportos fez parte de uma Comissão
designada pelo Governador Major Luiz Cavalcante para escolher o local para a
construção do Estádio Estadual, o Estádio Trapichão. Juntamente com Nilo
Floriano Peixoto, Presidente do CSA, Alcides Nascimento, Presidente do
Estivadores, Abelardo Marinho, Presidente do Flamengo, engenheiro do DER e este
cronista que ouviu o depoimento do nosso personagem de hoje tivemos várias
reuniões até escolher o local onde foi construído o majestoso Rei Pelé.
O projeto Gol Beleza que ajudou os
clubes alagoanos por algum tempo teve o trabalho de José Sebastião Bastos. Ele
esteve em Aracaju onde já existia o Gol Beleza e trouxe para Alagoas todos os
detalhes do projeto. Conversou com o Governador Geraldo Bulhões que também
gostou da idéia e em pouco tempo os clubes já estavam sendo contemplados com o
novo projeto. O Gol Beleza foi lançado no Museu dos Esportes com a presença de
presidentes dos clubes e muitas autoridades. Foi um bom período para o futebol
alagoano. Os campos estavam sempre cheios e os clubes com dinheiro.
Bastinhos também teve a sua
colaboração na construção do Estádio Trapichão. Quando o Governador Luiz
Cavalcante decidiu abraçar o projeto para a construção de um Estádio Estadual
em Alagoas ele nomeou uma comissão para escolher o local onde poderia ser
construído o Estádio. A comissão não deu certo e visando dar mais impulso ao
seu desejo de construir o Estádio para registrar sua passagem pelo Governo de
um desportista autêntico o
O Major
resolveu nomear uma nova comissão. Apenas o engenheiro Antonio Araújo e
Bastinhos foram reconduzidos. Os novos nomes foram: Nilo Floriano Peixoto,
Alcides Nascimento, Abelardo Marinho e Lauthenay Perdigão. As quintas feiras a
comissão se reunia e saia à procura de um local para o novo projeto do Governo
de Luiz Cavalcante.
A morte não tem data nem hora para
chegar. No final do ano passado recebemos a triste noticia do falecimento de
Bastinhos. Ele se encontrava em Recife para fazer um tratamento e as coisas se
complicaram. A pedido da família o velório do nosso amigo foi realizado no
Museu dos Esportes. Assim, nada melhor que o Museu que fica do Estádio
Trapichão para que os amigos pudessem dar o ultimo adeus a um dos maiores
desportistas do nosso futebol. Era no Museu dos Esportes que Bastinhos teve
alguns de seus grandes momentos. Ele foi homenageado no projeto Cantinho da Saudade.
Foi uma noite das mais concorridas. Além das emoções daquela noite Bastinhos
também participava de quase todas as homenagens que eram realizadas no Museu
dos Esportes. Mais do que nunca José Sebastião Bastos faz parte dos arquivos do
Museu. Ele se foi, mas ficou a saudade, a lembrança de um desportista que vai
fazer falta ao futebol brasileiro.
Este é o José
Sebastião Bastos, um cartola diferente. Um dirigente que conseguiu, ao longo
dos anos, conquistar sólidas amizades entre os desportistas do Brasil inteiro e
na sua terra sempre teve a admiração e o respeito da grande maioria dos
alagoanos.
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