Um pequeno bilhete sobre os caminhos da vida neste
imenso Natal de 2011

Contexto pede para que seja atendido o
apelo de Maria Lopes e que você, ao encontrar a gente de rua, faça uma
reverência aos que conseguem sobreviver às labaredas do inferno urbano.
A base de Contexto, nesta
edição, foi montada pelas gravações de dois acadêmicos membros do Núcleo: Flávio Soares Salgueiro e João Paulo de
Carvalho Vasconcelos. O trabalho deles consistiu em registrar o depoimento, mas
isso é extremamente importante, um
pequeno começo.
Jingle Bell para todo mundo e um beijo no coração das Marias Lopes!
Sávio de Almeida
Um pouco sobre a vida de Maria Lopes
Luiz Sávio de Almeida

A droga entra pesada; o ESTADO é um estado-serviços e tem cara, rosto certo. O que ela fala sobre a polícia é contundente, não importando se é
fruto ou não da sua construções de verdades. Seria uma vingança? Uma forma de tentar avaliar o quadro pelo que
ela tem mais de acesso que é o bandido? E ela se coloca como se não tivesse
escolha: para ela, do seu ponto de vista, melhor o bandido e aí, ela necessariamente
tem que encontrar uma brecha para justificá-lo. E nasce um jogo: ele mata para não morrer,
como se o crime fosse a justificativa para uma cadeia de crimes. Maria Lopes
está entre o bem e o mal? Na verdade, o que são bem e mal para Maria Lopes? Existe isso?
Será que Maria Lopes se vinga do Estado que a pune e o
pune por uma forma típica de verbalizar as contradições? Neste depoimento, em nada pesa se o que é dito
é verdadeiro ou não; importa que pode ser dito, quem sabe com uma amarra na
realidade, quem sabe por achar que deve ser assim? Será que a Maria Lopes
vinga-se da sociedade ao falar no estado?
São muitas e muitas as perguntas que tornam a entrevista um fértil material
para hipóteses.
É possível que haja a possibilidade de ter acontecido uma
interferência errada da polícia? É sim. Mas se pode a partir daí, criminalizar
a polícia? Como? O importante é que a ausência da plena
cidadania, como se pode deduzir, leva a
encontrar e realçar acentuadamente as marcas de perseguição pelos que dão vida
ao estado. O que se fala da saúde, é o
mesmo que se fala da polícia. É possível que aconteça um fato? É possível. Isto
leva à criminalização da saúde? A
ausência de um sentido de cidadania, leva a que o quase ou não-cidadão construa
a solidão cívica, como está na lógica da preferência ao bandido, seguramente
exótica, mas possível.

O interessante, é que Maria Lopes se identifica a um
grupo, que, mesmo informe, demanda senso
de pertença. Há um trecho importantíssimo, quando ela reivindica para todos. Em
nenhum momento, Maria Lopes choraminga e até mesmo traça o perfil do político
que mereceria voto: aquele que atendesse à gente da rua, uma espécie de
sociedade ambulante que vive nesta Maceió. A miséria é vista no coletivo dos
que perambulam, estão aqui e ali, moram lá e cá, daqueles que jamais diriam de
um domicílio, apesar de tão sabido.
Outro ponto para ser verificado na leitura deste
documento, é que ela não sai distribuindo culpas pelas escolhas pessoais que
são realizadas. Por outro lado, seus
apelos são dirigidos à sociedade e, aí, Maria Lopes reivindica, essencialmente,
que se quebre o preconceito.
Maria Lopes não seria possível aqui no Contexto para
dialogar conosco, se não contássemos com os trabalhos do Núcleo. Maria Lopes é uma figura humana, que pede
igualdade. É de cortar o coração – como diria a minha mãe –, quando se lê a
imensa vontade que tem Maria Lopes, de comer uma pizza em família. Contexto jamais
assumiria a responsabilidade de dá-lo como sendo obrigatoriamente verdadeiro no
todo ou em parte. Seria impossível enveredar por aí. O que sabe é simples: o
depoimento deve estudado e é matéria prima para análise desta relação entre
o direto, a sociedade e a violência.
gazetaweb.globo.com
gazetaweb.globo.com
Contexto foi e como o
documento, também, um mero canal de informe sobre o que pensa uma pessoa de
rua. É um documento que deve ser lido com carinho e cuidado pelo estado e pelo
cidadão comum. Seria ótimo que a polícia o
estudasse, que a saúde o estudasse. É que talvez estejamos diante de
duas perguntas aparentemente tolas: a) o que seria uma segurança própria para o
rueiro que vem sendo assassinado e b) qual seria uma saúde rueira? Temos que
aprender um pouco a olhar o mundo por baixo, onde, muitas vezes, as vidas se
desmancham. É uma boa oportunidade ler este material produzido pelo Núcleo que
é nosso parceiro. Levy-Strauss certa feita e tomando Rousseau como base,
tratava do ganho hermenêutico sobre a discussão de algo semelhante a este
depoimento: não importa se é verdade ou não, o fundamental é que se tem de ter
uma consistente discussão sobre ele.
Mas Natal não é um
tempo para tanta racionalização; é para sentir mais uma vez, o apelo fraterno
que deve nos circundar diariamente.
Feliz Natal Maria Lopes!
É o que Contexto lhe deseja.
A
vida de Maria Lopes não é sopa!
Tenho
24 anos, 2 filhas. Elas moram no Tabuleiro,
com a minha mãe e meu padrasto. Eu
só queria saber de ficar no mundo, droga, me prostituir. Ai minha mãe disse que
ia criar; aceitei, e graças a Deus estão muito bem criadas. Nasci
aqui mesmo em Maceió, Tabuleiro
.
.
Os amigos e a onda do
vício
Comecei
a me envolver com droga através de amigos. Não estava indo para a escola, comecei
pegando loló, depois passei pra maconha, ai gerou crack. Ai minha família tentou me dar apoio e eu não
queria. Passava 3, 4 dias sem ir em casa. Quando ia , era só pra comer e
dormir. Ai, eu me deixei no mundo. Achei
melhor tá na rua do que dando trabalho à família.
Eu
me tornei moradora de rua porque eu passava de segunda a sexta fazendo
programa, e nisso ficava usando droga. Nunca cheguei a ficar assim dormindo na
rua não, mas morar eu morava; só não dormia, porque tinha medo, passava a noite
me prostituindo e me drogando pra não dormir. Tinha medo de dormir; tirava assim um cochilo, negócio de 2 horas da
tarde. Era lá na Federal. Lá nos carros, carro velho, dentro de ônibus, caminhão
velho, debaixo de caminhão. Ai eu cochilava assim de tarde. Quatro horas, eu já
tava me arrumando, já pra ir pra o ponto
de novo me prostituir.
Um pouco sobre a droga
João Paulo |
Nunca cheguei a ser expulsa de casa; já saí por espontânea vontade minha mesmo, pra não
dar trabalho a eles e por eles não terem concordado com meu ex- casamento, meu
ex-relacionamento. Usei droga antes do casamento, mas ele já me influenciava também a usar, ele
ia fazer usar pra me prostituir, pra usar mais ele. Eu vi que não dava certo, não
ia ter futuro nenhum com ele, achei melhor partir pra outra. Ele sabia; ficava me esperando no ponto todo dia; eu que
dava dinheiro a ele e ele que ia comprar a cola Eu me prostituía.
Estudei
até o 1 º ano. Meu pai era [...],
minha mãe só vive tomando conta das minhas filhas... Minha mãe é dona de casa.
Nunca faltou nada pra mim, graças a Deus até hoje. A família nada tem a ver com
a droga; a família não. Ao contrário, eu agradeço a eles pela força que eles
ainda estão me dando aqui, na hora que eu quiser voltar pra casa, eles estão de
braços abertos, como minha família sempre disse, só que não quer eu no mundo das
drogas novamente. Tem medo de eu aparecer morta, que é o que mais aparece hoje
em dia. Quem se envolve com crack, sempre aparece morta ou presa.
O coroa e a filha
O
pai da mais velha das minhas filha, ele
faleceu, era um coroa, [...] aposentado da [...], tá ai a pensão pra resolver.
E o da mais nova, a vó dela é [...], só dá as coisas quando quer e minha mãe
vive pela mais velha. É. E tem o meu
padrasto também, que ele é [...]. Eu tinha 13 anos de idade, meu pai tinha um
bar. Ai ele se agradou em mim, quis investir em mim, eu sempre fui
interesseira, ai concordei. Ai pronto; ele faleceu, deixou a pensão da minha
filha na justiça,
foi agora recente que ele faleceu. Com 2 anos depois ele faleceu. Eu num cheguei
nem há um ano, já fui logo pegando um
bucho... Eu tinha 13, ele 57. A minha família apoiou; antes ele, do que chegasse e eu perder minha
virgindade com um cara ruim...
Depois
disso eu fui morar com ele. A família
dele não concordou, a família dele nunca concordou, porque eu era nova. “Ah
painho não pode não. Tá com uma menina nova, porque você pode ir preso, até
como pedófilo”, e nada empatou de eu ficar com ele. Mas chegou um certo tempo
que eu tava sentindo tanta vergonha dele, que ele ia me levar no colégio, que
eu não quis mais ficar com ele, ai eu fugi de casa com um rapaz. Ai eu vim aparecer
depois que ele já estava falecido.
Passei quase 1 ano com ele,
engravidei dele. Criei minha filha com ele até com 1 ano de idade. Quando ela
completou 1 ano de idade, eu fui embora
mais outro rapaz. Ai ele ficou
cuidando dela com a minha mãe, até hoje. Ele reconheceu. Minha outra
filha foi de um relacionamento de um homem novo, de 20 anos, o negócio dele só
era beber, não usava drogas, só beber e fumar mesmo. E também não deu certo,
desgostei dele, de repente passou.
Quando eu desgosto...
A irmã e a rua
Eu
estava falando com a minha irmã, que ela também é usuária de crack... Ela não é moradora de rua. Ela mora na casa da
minha mãe. A gente já saiu, já passou a morar comigo na rua. Ela foi primeiro do que eu morar na rua. Ai a
gente ficou morando na rua, fazendo programa também na rua. E minha família não
quer mais ela dentro de casa por causa dos erros que ela faz. Porque eu não roubava
muito, mais me prostituía, meu negócio era mais me prostituir e ela era mais
roubar, meter faca nos outros. Minha família não tava mais aguentando ela
dentro de casa, ela é uma viciada. Eu graças a Deus eu sou uma ex, eu me
considero uma ex-dependente química. E ela não, ela é ainda é uma viciada. Faz
de tudo minha família para tirar esse vício.
A
gente dormia juntas. Dormia no mesmo
lugar. Ás vezes ela saia mais o namorado dela, porque ela tinha um namorado que
concordava com os programas. Ai a gente se encontrava mais no ponto de fazer
programa.
A discriminação
A
gente somos discriminados por a gente ser, o que a gente somos. Muita gente
discrimina, não dá valor, não dá oportunidade. Eu acho assim que morador de
rua, ex-dependente químico, ele tem direitos. De chegar ajudar a gente, chegar
dar a apoio, de abrir as portas pra gente, porque a gente tá aqui pra recomeçar
de onde a gente parou.
Estamos aqui pra pedir ajuda assim, pra
continuar nossa vida. E pra gente não cair nas drogas e não voltar e ter um
recaída era bom que todos abrissem a porta do emprego, investissem mais na
arte, na cultura e assim vai... Porque quando a gente passa escondem a bolsa, a
gente passa diz “uma prostituta”, ficam ali discriminando a gente dizendo “ a
prostituta vai ali pro
beco por 10, 15 reais só pra usar o crack”.
A polícia e a imagem que Maria Lopes passa
Os
próprios policiais estão ali. Ao invés de pegar, levar preso, não... Pega,
maltrata, chuta, joga ... Quando a gente tava usando a droga, tomava o cachimbo
da gente, batia na gente e eles não tinham direito de fazer isso com a gente,
com nenhum drogado, com nenhum dependente químico, eles não tinham direito.
Principalmente as mulheres que apanhavam por policiais homens.
Então
eu dou mais valor aos bandidos do que a própria polícia. Quando deve, é diferente. Eu acho assim que cada um mantém
o vício quando pode, quando não pode, tá errado, tem que pagar mesmo. Eu não
acho certo, entendeu? Porque ninguém tem direito de tirar a vida de ninguém, a
não ser Jesus. Matam.
Aconteceu
com meu ex-cunhado. Ele tava vendendo droga no ponto dele, não sei de onde o dono dele é, não posso
dizer, e chegaram e mataram ele. Bem pertinho dela, porque ele devia droga, não
pagou. Então se ele não paga o cara, o chefe, o próprio chefe manda matar ele. Porque
não é dele, ele já pega de outra pessoa pra vender. Então como eles pegam de
outra pessoa pra vender, ele não tem como pagar do bolso dele, ai ele paga com
a própria vida, por causa de um rueiro.
Porque
eu acho assim, uma pessoa que deve e não tem condições de pagar ou deixa o
vício de uma vez ou vai pra longe, vai ver se consegue construir a vida de
outra maneira e longe. Mas tem gente que deve e fica ali no mesmo canto ou
então vai pra outro canto e faz pior. Uma pedra e R$ 5,00. Eles dão um tempo certo pra vim pagar:
“Vou dar 3 dias pra você me pagar”; depois desses 3 dias eles não vendem mais.
Agora se você pagar eles vendem a você novamente, mas se você não pagar ele já
vai atrás de você pra matar. Seja o valor que for. Seja R$ 5,00, seja R$ 20,00...
Porque eu acho assim...toda mulher de programa,
ela tá ali porque precisa. Pode ser pra manter a família em casa, pode ser pra
manter o vicio, como era o meu caso. O traficante quando ele quer fazer um
programa com a gente, ele não vem assediar a gente, não vem pegar a gente a pulso
que nem a polícia faz. Eles paga, eles dá 2 pedras, 3, dá o dinheiro. Aí a
gente vai e faz o programa.
Já, já fui estuprada. Por policias não.
Fazendo programa eu já fui estuprada duas vezes. Mas é como diz a história,
você vive no vício da droga só quer saber dela, quanto mais usa, mais você
quer. Quando a gente entra ali no carro pra fazer um programa, a gente tá
sabendo que vai, mas não tá sabendo se volta.
O crime que eu já pratiquei era comigo mesma
de estar vendendo meu próprio corpo por mixaria, por besteira, mas crime não. O crime que já cheguei a roubar, roubava dentro de casa, nunca roubei na rua
não. O mundo da droga
Veja,
algumas drogas, a gente se torna um zumbi das drogas, a gente quer mais e mais,
ai a solução quando a gente num acha rápida pra se prostituir é roubar.
A ajuda dentro do grupo
Não
fosse a droga, eu estaria empregada, com
as minhas filhas, com a minha família, com um casamento bom. Agora eu tô com
outra pessoa vai fazer um mês, ele que tá me ajudando a sair das drogas, tá me
dando apoio. Ele também era dependente químico, tá com um mês também que parou,
depois que me conheceu, a gente se conheceu.
A
gente parou. Assim eu to achando forças aqui e nele. Porque a gente sempre
conversa, quando bate a abstinência em mim, bate nele, ai a gente senta
conversa, ele pede pra mim não usar, eu peço pra ele não usar, ai gente acaba
se entendendo e nós não usa.
O resultado da droga e a
saúde
A
droga ela me ressecou toda por dentro, teve um momento que não tava podendo comer
nada, ai eu fui, o que me passaram foi soro. Mas assim quando a gente chega no hospital
com começo de overdose... Quando chega no hospital com começo de overdose, com
algumas doenças através do crack, eles não fazem, deixam a gente sofrer um
pouquinho, pra gente vê que a vida não
foi feita de droga pra gente usar.
Cheguei
lá com as minhas próprias amigas mesmo,
que eu achava que eram amigas, mas na verdade eram só amigas pra ali mesmo no
meio da droga, colegas mesmo a gente ali todo reunido usando, ai deu um branco
em mim, aí eu desmaiei, aí quando eu acordei já tava lá no Pronto Socorro, já
tava com o soro, injeção...
Na
primeira vez eu fui bem tratada, mas na segunda vez eu não fui não. “Ah é um maconheiro
qualquer deixa ai pra aprender, dá trabalho a mãe, dá trabalho a gente, é bom
que morre logo” Disseram tudo isso. E já
ouvi também muito da polícia. Quando a gente vai vê amigo morto ou uma pessoa
conhecida morto que era envolvido com droga.
O rueiro e os outros
Tem
pessoas assim que nem vocês, que ainda pensam em ajudar a gente, só que não tem
como a ajudar a gente, porque a gente tem que primeiramente se ajudar. Mas
vocês também não podem ir abrindo porta
de emprego pra gente. Eu vejo em vocês assim meninos que conseguiu na vida sem
drogas, corajosos.
Esses filhinhos de papai, passando e olhando
pra pessoa, filhos do cranco. Eu tinha raiva, xingava, filhinhos de papai...
xingava muito Eram pessoas que não olham
pra gente, que olham com discriminação. Fico com raiva e muita. Porque a gente não tem a oportunidade que
vocês têm, a gente não teve o ensino que vocês teve, porque vocês são mais bem
sucedidos do que a gente.
Uma vida que poderia não
ter sido
Teve
é verdade, oportunidade que a gente mesmo jogou fora. Mas tenho raiva. É
inveja... dispensei. Ah me arrependo.
Hoje em dia se eu não tivesse usado droga era pra tá assim que nem vocês bem
sucedida, com estudo né, com a família. Eu me arrependo muito. A gente tem que
deixar. Tem o meu irmão. Ele já foi traficante, já foi preso e hoje em dias
graças a Deus, primeiramente a Deus, hoje em dia ele é bem sucedido. Casou,
trabalha fichado. Largou tudo que ele fazia antes e tá com um novo emprego.
Tudo
é possível? Eu tenho esperança de mudar, de ter uma vida melhor. Do mesmo jeito
que o meu irmão, que era pior do que eu. Era traficante e mudou a história dele,
a vida dele. Porque que eu não posso mudar a minha? Ele
usava e vendia. Se ele mudou a vida dele, que a vida dele tá melhor do que antes,
porque a minha não? Tô me espelhando nele.
A qualidade do voto
A qualidade do voto
Votar, eu voto. Mas eu ainda estou sem documentos,
mas eu voto. Porque hoje em dia até pra gente tirar novos documentos a gente tá
sem oportunidade. Eu escolho por aquele
que faz alguma coisa, pelo que faz alguma coisa pela cidade, pelas pessoas, que
ainda ajuda, chega junto. Porque hoje em dia eu não vejo, não tenho um. Vou
dizer assim, se eu tivesse com o meu título agora, se fosse a hora de votar em
algum, não votaria em nenhum, porque eu não vejo nenhum fazer nada, só promessa.
Porque
era pra eles botar mais casa de recuperações, era pra... Porque tem tanto
terreno vazio ai que... Da Caixa mesmo, pra prefeitura mesmo que não fazem uso,
poderiam botar casas pra pessoas que moram na rua.
A marcha da esperança
Eu
sinto esperança. De vocês mostrar, publicar e vê se alguém é capaz de fazer
alguma coisa.
A
educação a gente tem direito. Podia botar um professor que viesse pra cá ou
arrumasse vaga pra gente no colégio que a gente também tem direito. Sobre a
saúde, a gente poderia cada um, todos nós ter o cartão do SUS, a gente não tem.
Ai como a gente não tem, a gente não é
atendido ou é atendido pelo jeito que eles bem querem.
Tenho
notícia do povo que viveu comigo. Teve uma aqui que mataram uma, porque tava
roubando pra manter vício. Não tava mais conseguindo fazer programa de magra,
de feia, porque a droga deixa a gente assim. Eu tive notícia de que mataram uma
que a gente andava sempre muito junta eu e ela. E eu tento evitar de saber
deles, porque eu oro por eles, mas eu tento evitar. Porque isso me dói, me
machuca saber que eu não posso está ali, sabendo que eles não tão tendo a
oportunidade que eu tô tendo.
Eu
tô tendo a oportunidade de dormir. Tenho água pra tomar banho, boa ou ruim
tenho comida pra comer, eles não. Então
eles não tão tendo isso. Tão lá no sereno, levando chuva, no relento, sendo
maltratado pela população, pela polícia mesmo.
Eu tenho um sonho
Eu
nunca pensei em felicidade não. Pra mim felicidade nunca existiu. Quando eu
comecei a voltar a
usar droga, a família acabou pra mim, saiu tudo desmoronando, os
relacionamentos nunca davam certo, por causa, através da droga. Nenhum momento... Nem na hora que tava usando
a droga. Porque eu usava e no mesmo tempo eu terminava de usar, ia chorar,
arrependida. Mas como ela falava mais alto do que eu, era mais forte do que eu,
ai eu voltava a fumar novamente.
Ah
antes do crack eu era feliz. Tinha uma vida legal com a minha família,
passeava, era uma família, né? A gente se reunia final de semana, saía pra
pizzaria, ai eu era feliz antes do crack. Depois que eu comecei a usar o
crack... Só tô sabendo o que é felicidade agora porque eu saí do crack.
Hoje eu me sinto feliz. Com todos os
obstáculos que eu ainda estou enfrentando, discriminação ainda. Ah tem gente
que passa por mim ah...família mesmo diz:
“Eu não dou um mês que ela vai voltar pras drogas” e não dão nada por mim. É
mais eu tô de cabeça erguida, tentando mostrar que eu vou conseguir pra aqueles
que não deu nada por mim ou não deram, pra mostrar que eu vou conseguir tudo de
volta. Que eu vou consegui meu sonho, realizar meu sonho, ser modelo.
Meu
sonho é ser modelo, linda e maravilhosa. Desde sempre eu tive esse sonho de ser modelo
e eu vou conseguir.
Um apelo à fraternidade
Eu só peço pra pessoas que têm dinheiro, os
filhinhos de papai, o povo que tem dinheiro, que ajude, que ajude os moradores
de rua, e os... nem os aviciados,
porque nem todos são ruim, nem todos estão ali pra roubar não, nem estão ali
porque quer. Abram as portas de emprego,
tirando da rua, dando alimentação... E é isso ai...xauuu