segunda-feira, 9 de abril de 2012

[HISTÓRIA DOFUTEBOL] PERDIGÃO, Lautheney. Depoimento para a história: Bastinho, um cartola diferente








PERDIGÃO, Lautheney. Depoimento para a história: Bastinho, um cartola diferente. Tribuna Independente. Maceio, 8 abr. 2012. Contexto.






DEPOIMENTO PARA A HISTÓRIA: Bastinho, um cartola diferente

Lautheney Perdigão


          José Sebastião Bastos, o Bastinho, nasceu na cidade de Fernão Velho no dias 12 de setembro de 1922. Casado com dona Gerba teve uma filha, Maria Dorotéia e um garoto Daniel que criava como seu afilhado. Formado na Faculdade de Direito de Alagoas, passou a maior parte de sua vida dedicada ao esporte, em particular, o futebol. Depois de ocupar vários cargos na Federação Alagoana de Desportos, foi eleito, pela primeira vez, presidente da entidade e ficou por dez anos. Tempos depois conseguiu voltar a dirigir o futebol, agora na Federação Alagoana de Futebol.

Bastinho e Aldo Ivo
          Na vida deste nosso personagem aconteceram coisas incríveis. Foi presidente da Federação Alagoana de Desportos sem nunca ter chutado uma bola. Foi comandante da Guarda Civil sem ter sido militar. Foi Diretor Administrativo do Serviço de Engenharia do Estado sem nunca ter sido engenheiro. Foi presidente da Colônia de Pescadores sem nunca ter lançado um anzol no m ar. Também, foi Vereador, Diretor do Serviço de Patrimônio do Estado. Dirigiu o Departamento de Educação Administrativo da Codeal. Chefe de Gabinete das Secretarias do Planejamento, Educação, Indústria e Comercio. Vice–Presidente da Confederação Brasileira de Futebol. Aposentou-se como Consultor jurídico do Estado.
          Bastinho é o desportista que mais tempo ocupou a presidência da Federação Alagoana de Futebol. Ele está na pequena lista dos dirigentes que são mais respeitados e admirados por todos. Nos momentos mais difíceis do nosso futebol, Bastinho estava sempre presente para servir de mediador. Muitas vezes teve que participar de reuniões com dirigentes dos tradicionais CRB e CSA e, com seus argumentos, reatar os laços de amizade entre os dois clubes. Era antes de tudo, um conselheiro. Sempre procurando os caminhos certos que são orientados por leis e regulamentos.
          Na década de cinqüenta Carlos de Miranda, que era Presidente do Tribunal de Justiça Desportiva, convidou Bastinho para ser suplente do TJD. Seu nome foi levado à consideração da Assembléia da Federação Alagoana de Futebol e aceito pelos clubes. A Federação, na época, era eclética. Além do futebol, tinha futebol de salão, voleibol, basquetebol, natação, xadrez, ciclismo e atletismo. Ficava num casarão na Praça Sinimbú, onde hoje se encontra o Tribunal Regional Eleitoral. Um mês depois Bastinho já era convocado para ser juiz efetivo em uma das vagas do TJD. Começou a se interessar pela legislação esportiva e acompanhar o dia a dia da Federação. Foi seu primeiro passo no esporte alagoano.

Bastinho, Havelange, Renan Rosas
          Em 1958, Ulisses Marinho que era o Vice-Presidente da Federação Alagoana de Desportos, foi convidado para ser Presidente do Esporte Clube Alagoas e deixou vago o cargo. Eraldo Calado, Diretor do Centro Sportivo Alagoano, indicou seu nome junto à Assembléia dos clubes para substituir Ulisses Marinho. O Presidente, Major Kleber Rodrigues, concordou e os clubes também. A subida foi rápida. No ano seguinte, o Major Kleber foi transferido para uma Guarnição Federal no Piauí. Bastinho assumiu a Presidência pela primeira vez. Em dezembro daquele ano foi candidato e eleito o novo Presidente da Federação Alagoana de Desportos. Ele não se esquece de muitos desportistas que conheceu no inicio dessa caminhada. Nomes que eram respeitados pela contribuição que davam ao esporte alagoano: Alexandre Dantas, Jair Galvão, Almachio de Oliveira Costa, do TJD, eram homens justos. José Crispim, grande amigo de Bastinho, foi seu Vice-Presidente até 1968, quando ele deixou a Federação pela primeira vez.
          E foi no seu ultimo ano como Presidente da Entidade que Bastinho teve que resolver um caso Capelense e Penedense. Depois de estudar o caso teve que decidir e, consciente, deu ganho de causa ao Capelense. Foi a primeira vez que um clube ficou contra Bastinho. Dirigentes do Penedense, inconformados, fizeram campanha apresentando o Presidente da Federação como inimigo dos clubes do interior. O que não era verdade. Nas gestões do Bastinho, passaram a participar dos campeonatos alagoanos os clubes interioranos com Capelense de Capela, ASA de Arapiraca, Rio Branco de Massagueira, CSE de Palmeira dos Índios e o próprio Penedense de Penedo. Nessa campanha, o CRB indicou o nome de Remi Maia, de Palmeira dos Índios, para Presidência da Federação. Bastinho perdeu sua primeira eleição. Entretanto, o tempo passou, ele ficou um pouco afastado da entidade, mas depois voltou a se candidatar e ganhou outras três eleições. Voltou a Presidência da Federação de 1985 a 1988 e 1991 a 1995 e no último mandato ficaria até 1999. Quando foi eleito um dos cinco Vice-Presidentes da Confederação Brasileira de Futebol, entregou o cargo para Raimundo Tavares, seu Vice-Presidente. 

Bastinho, Havelange, Nilo Floriano Peixoto
          Em 1966 aconteceu um fato que Bastinho gosta de relembrar. O Departamento de Árbitros era autônomo e dirigido pelo competente Moisés Silva. Na semana do clássico surgiu um problema. Nilo Floriano, Presidente do CSA, e Severiano Gomes, Presidente do CRB, não chegaram a um acordo para a escolha do arbitro da partida. Partiram para arbitro de outro Estado. Também não houve acordo. Estava criado o impasse. Bastinho reuniu Biano, Nilo e Moisés e colocou quinze árbitros alagoanos para um sorteio. O Presidente do CRB impugnou Manoel Amaro. Bastinho não aceitou e no sorteio deu Manoel Amaro. O CRB não compareceu a Pajuçara para enfrentar o CSA e perdeu os pontos. Apesar dos protestos dos dirigentes alvirubros, o Presidente da Federação se manteve firme. Entrou como apaziguador e tentou o equilíbrio. Como nado deu certo, teve que usar de energia para fazer cumprir o regulamento. O Departamento de Arbitro era autônomo e Bastinho ficou do lado do seu departamento.
          Entre os muitos recordes do Bastinho que Bastinho possui, um deles é imbatível. Ele é o único Presidente de Federação de Futebol do Brasil a ser empossado numa sala de despachos de um Palácio do Governo e com a presença de João Havelange, Presidente da FIFA. Somente o prestigio, a amizade e tudo de bom que fez ao longo de sua caminhada pelas estradas do esporte, fizeram com que Bastinho conseguisse realizar um sonho acalentado há muitos anos. Uma posse de alto nível, com a presença de muitas autoridades e o seu compadre Havelange.

          A amizade com João Havelange começou em 1959. Ele foi apresentado ao então presidente da CBD pelo Presidente da Federação Pernambucana de Futebol Rubens Moreira. Ali se consolidou uma amizade que se aprofundou entre as famílias e que perdurou até sua morte. João Havelange é padrinho de Dorotéia, filha do Bastinho. Aliás, ela fez seu curso de inglês na área de comunicação, na Suíça, onde está a sede da FIFA. Tudo patrocinado pelo padrinho. E não foi uma fineza de empréstimo. Foi fineza de cordialidade, de cavalheirismo, de fidalguia, de lealdade, de seriedade. Havelange não precisava do voto do Bastinho, nem Bastinho era eleitor da Fifa.
          José Sebastião Bastos tinha na sua casa uma sala de troféus que faz inveja aos grandes colecionadores. É o único Presidente de Federação que recebeu cinco bolas de ouro. Comendas de Beneméritos da CBD, CBF e da Federação Pernambucana de Futebol. Miniatura da Taça Jules Rimet conquistado no México e da Taça FIFA ganha nos Estados Unidos. Diversos diplomas de Beneméritos das Federações do Rio de Janeiro, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Espírito Santo, Brasília e Associação Alagoana de Imprensa. Cidadão Honorário de Arapiraca e Viçosa. Diplomas de bons serviços prestados ao esporte alagoano nos governos de Afrânio Lages e Divaldo Suruagy. Diplomas da Confederação Sul-Americana de Futebol pelos serviços prestados na Copa América em 1989. Muitos troféus e medalhas, Além de chefiar duas delegações da seleção brasileira de juniores que disputaram campeonatos Sul-Americano e mundial. Entre as muitas homenagens que recebeu Bastinho sempre lembrava com carinho daquela que teve no Museu dos Esportes no projeto Cantinho da Saudade.

         
 Sua indicação para Vice-Presidente da CBF partiu dos colegas Presidentes das lideradas pelos Estados do Nordeste. José Clarivaldo de Souza, Presidente da Federação Sergipana foi seu principal nome nessa indicação que foi seguida pelos demais dirigentes. Na Confederação Brasileira de Futebol ele poderia ajudar mais o futebol alagoano. Antes, Bastinho já tinha sido Diretor de Coordenação Regional da CBF. Era um relações publicas entre os Presidentes das Federações e o presidente da CBF. Durante dois anos esteve nesta função e realizou um excelente trabalho com os Presidentes que integravam o colégio eleitoral. E ele não esconde que João Havelange e Rubem Moreira foram os grandes dirigentes do futebol brasileiro.  Rubens Rodrigues Moreira foi um líder pela sua capacidade e lealdade. Rubem Moreira foi o amigo de todas as horas. Para Bastinho João Havelange é um homem de porte universal. Mas em qualquer que esteja ele sempre se lembrará o seu compadre. A amizade entre os dois nunca teve um arranhão. Foram amigos para sempre.
          Em 1967 José Sebastião Bastos, Presidente da Federação Alagoana de Desportos fez parte de uma Comissão designada pelo Governador Major Luiz Cavalcante para escolher o local para a construção do Estádio Estadual, o Estádio Trapichão. Juntamente com Nilo Floriano Peixoto, Presidente do CSA, Alcides Nascimento, Presidente do Estivadores, Abelardo Marinho, Presidente do Flamengo, engenheiro do DER e este cronista que ouviu o depoimento do nosso personagem de hoje tivemos várias reuniões até escolher o local onde foi construído o majestoso Rei Pelé.
          O projeto Gol Beleza que ajudou os clubes alagoanos por algum tempo teve o trabalho de José Sebastião Bastos. Ele esteve em Aracaju onde já existia o Gol Beleza e trouxe para Alagoas todos os detalhes do projeto. Conversou com o Governador Geraldo Bulhões que também gostou da idéia e em pouco tempo os clubes já estavam sendo contemplados com o novo projeto. O Gol Beleza foi lançado no Museu dos Esportes com a presença de presidentes dos clubes e muitas autoridades. Foi um bom período para o futebol alagoano. Os campos estavam sempre cheios e os clubes com dinheiro.
          Bastinhos também teve a sua colaboração na construção do Estádio Trapichão. Quando o Governador Luiz Cavalcante decidiu abraçar o projeto para a construção de um Estádio Estadual em Alagoas ele nomeou uma comissão para escolher o local onde poderia ser construído o Estádio. A comissão não deu certo e visando dar mais impulso ao seu desejo de construir o Estádio para registrar sua passagem pelo Governo de um desportista autêntico o
O Major resolveu nomear uma nova comissão. Apenas o engenheiro Antonio Araújo e Bastinhos foram reconduzidos. Os novos nomes foram: Nilo Floriano Peixoto, Alcides Nascimento, Abelardo Marinho e Lauthenay Perdigão. As quintas feiras a comissão se reunia e saia à procura de um local para o novo projeto do Governo de Luiz Cavalcante. 
          A morte não tem data nem hora para chegar. No final do ano passado recebemos a triste noticia do falecimento de Bastinhos. Ele se encontrava em Recife para fazer um tratamento e as coisas se complicaram. A pedido da família o velório do nosso amigo foi realizado no Museu dos Esportes. Assim, nada melhor que o Museu que fica do Estádio Trapichão para que os amigos pudessem dar o ultimo adeus a um dos maiores desportistas do nosso futebol. Era no Museu dos Esportes que Bastinhos teve alguns de seus grandes momentos. Ele foi homenageado no projeto Cantinho da Saudade. Foi uma noite das mais concorridas. Além das emoções daquela noite Bastinhos também participava de quase todas as homenagens que eram realizadas no Museu dos Esportes. Mais do que nunca José Sebastião Bastos faz parte dos arquivos do Museu. Ele se foi, mas ficou a saudade, a lembrança de um desportista que vai fazer falta ao futebol brasileiro.
Este é o José Sebastião Bastos, um cartola diferente. Um dirigente que conseguiu, ao longo dos anos, conquistar sólidas amizades entre os desportistas do Brasil inteiro e na sua terra sempre teve a admiração e o respeito da grande maioria dos alagoanos.

[HISTÓRIA DOFUTEBOL] ALMEIDA, Luiz Sávioi de. Um abraço no Bastinho









ALMEIDA, Luiz Sávio de. Um abraço no Bastinho. Tribuna Independente. Maceió, 08 abr. 2012. Contexto.


Um pequeno bilhete sobre Bastinho
Morreu Bastinho, um homem que marcou a história do futebol alagoano, como dirigente da Federação Alagoana de Desportos, depois de Futebol.  Contexto dá um abraço na família, em sua esposa, em sua filha de quem me lembro ainda pequena.
Sávio de Almeida


Um abraço no Bastinho

Luiz Sávio de Almeida

                Uma vez e faz certo tempo, estávamos conversando no Trapichão sobre a história do futebol em Alagoas. Lembro que a conversa resvalou para cartolas. A roda era Roberto Mendes, Toroca e mais uma pessoa de quem não me recordo. Parece que houve um acordo: o grande cartola de Alagoas foi o Bastinho. Vamos e venhamos: foram anos à frente da Federação, cerca de dez anos e profundamente integrado ao circuito nordestino de apoio a Havelange; inclusive havia uma grande ligação com Pernambuco, que, parece, cumpria a função de coordenação política dos interesses de Havelange no Nordeste.
                Quem lidou pessoalmente com Bastinho, sabe da sua habilidade afável, do modo como procedia na coordenação política do futebol, sempre abrindo espaços para conversações, para entendimento.  Na verdade, era um hábil negociador que traçou uma rede de alianças locais e, ao mesmo tempo, jogou com a moeda das suas ligações com Havelange, de quem era declarado eleitor e a quem sempre foi fiel.  Então, Bastinho demarcava sua posição pela sua vinculação nacional e seu comportamento mediador no desenvolvimento da política local do futebol. Ao lado dessas habilidades, Bastinho sempre foi pessoalmente honesto. Não conheço, durante anos de convivência, qualquer insinuação do nome do Bastinho ligado à corrupção. Jamais. Honesto sim!
                Futebol, em sua história, é muito forçado sobre a prática esportiva em si, pesando elementos como clubes, craques, as torcidas e ficando de lado um dos seus aspectos mais importantes: o desenvolvimento de sua política, a forma como se lida e consolida o poder no seio de suas hostes. De muito, a Federação Alagoana de Desportos merece um estudo acadêmico, uma espécie de verificação da caminhada da Coligação Esportiva para Federação Alagoana de Futebol. A Coligação já estava a demonstrar a complexidade da vida esportiva no Estado e a necessária insinuação de interesses.  A mudança para a Federação Alagoana de Desportos é de 1934, em plena consolidação de Vargas e não deve ter sido por coincidência que em 1932, Edgar de Góes Monteiro estivesse na Presidência da Coligação.
São poucos, contudo, os nomes de alta expressão política na vida local a estarem na presidência da entidade, pelo que podemos identificar. Bastinho sempre ocupou posições dentro do Estado, mas isto derivou bem mais de sua habilidade pessoal do que em razão de sua presidência que teve três períodos. O primeiro vai de 1961 até 1968, quando perde por negociação política urdida por Remy Maia que, por seu turno, vai ser sucedido por Orlando Gomes de Barros, Cleto Marques Luz e enfraquece com Heider Silveira, o que permite a Bastinho rearticular-se e cumprir o mandato de 1985 até 1988; volta em 1991 e vai até 1999 quando deixa para José Tavares, indo ocupar posição na CBF, sendo um Vice-Presidente da entidade.
Há um caminho do poder no futebol que vai do clube à Federação.  Como se dá o fortalecimento político para controle do clube; o que possibilita e como possibilita alguém tornar-se Presidente?  E como se negocia uma Presidência da Federação, praticamente colegiada? Como a Federação é vista pela massa de torcedores?  O time presidencia quando um dos seus de relevos é Presidente? Como se nota, há muito sobre o que escrever, na medida em que se deseje desvendar a caixa da política do futebol e da política no futebol, um universo sem dúvida complexo.
Bastinho é parte integrante desta história, estando na evidência ou nos bastidores, perdendo ou vencendo. Pelo que tudo indica, ao perder sempre preparava seu retorno e conseguia. Sabia, portanto, mais do que ninguém, manobrar as artes da política futebolística. E jamais se poderá pensar no encaminhamento do futebol alagoano sem passar por ele.  Estamos diante, portanto, de uma figura a ser tomada como exemplar. 
A minha grande aventura com o Bastinho faz muito tempo que aconteceu.  Saímos daqui para almoçar com o Pelé no Recife.  Eu não me lembro o que estava acontecendo no Recife e o almoço seria no Hotel São Domingos. Parece que eu estava com o Zé Lima. O restaurante estava cheio, mas o Pelé não foi; no entanto,  valeu a aventura
Vai lá Bastinho!