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SILVA, Jordânnya
Dannyelly do Nascimento. Estratégias de desenvolvimento: Fernão Velho. O Jornal, Maceió, Espaço, 26 Jul. 2009
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Jordânnya
Dannyelly do Nascimento Silva (23 anos), Arquiteta e Urbanista pela
Universidade Federal de Alagoas, mestranda do Programa de Pós-Graduação
Dinâmicas do Espaço Habitado – DEHA /UFAL. Foi integrante do Grupo de Estudos
de Problemas Urbanos (GEPUR) da FAU / UFAL, que estimula discussões a respeito
de problemas urbanos identificados nas cidades alagoanas, com o intuito de
apontar diretrizes para definições de políticas públicas, principalmente
referentes à questão da pobreza, e políticas de inclusão social, coordenado
pelo prof. Dr. Flávio Antônio Miranda de Souza. Este artigo – apresentado na
disciplina Formação do Espaço Alagoano – é resultado de seu Trabalho Final de
Graduação intitulado Estratégias de
desenvolvimento para o bairro de Fernão Velho: uma mudança de paradigma,
orientado pela profa. Dra. Ana Cláudia Rocha Cavalcanti.
Umas poucas palavras
Luiz Sávio de Almeida
Jordânnya
Dannyelly do Nascimento Silva (23 anos) é uma jovem pesquisadora em formação,
matriculada na disciplina Formação do Espaço Alagoano do Mestrado em Dinâmicas
do Espaço Habitado. Ela aborda neste texto o desafio que é o desenvolvimento da
área de Fernão Velho, enfatizando a formação
de uma mentalidade cooperativista e a necessidade de investimento na educação
local, trabalhando com as teses do capital humano e do capital social.
Basicamente entende que o processo de desenvolvimento deve vir acompanhado da
consciência local, aliada a investimentos e políticas públicas consequentes. Os dados por ela trabalhados foram
obtidos, principalmente, no projeto de extensão universitária Propostas de desenvolvimento para as
comunidades de Fernão Velho, Matadouro e Goiabeira, desenvolvido na
Universidade Federal de Alagoas (UFAL), disciplina de Sociedade, Meio Ambiente
e Desenvolvimento, ministrada pela professora Dra. Ana Cláudia Rocha
Cavalcanti. É preciso deixar claro que sua pesquisa
foi desenvolvida no período de 2006 a 2007, com as entrevistas sendo realizadas
de novembro de 2006 a janeiro de 2007. O que mudou? Boa pergunta! Deve ficar
claro que ela se louva em dados da disciplina mencionada.
Estratégias de desenvolvimento: Fernão Velho
Jordânnya Dannyelly do Nascimento Silva
O
ambiente urbano é heterogêneo e de contradições, o que é possível perceber ao
se lidar com áreas desenvolvidas e estagnadas. Em meio a esse universo, tem-se
que pensar em maneiras de intervir no urbano. Levando em conta tais questões, estudamos o bairro de Fernão Velho, Maceió, que
é parte da Área de Preservação Ambiental (APA) do Catolé e Fernão Velho, sendo Unidade
de Conservação Estadual. É também de interesse da Companhia de Abastecimento de
Água e Saneamento de Alagoas (CASAL), devido a sua importância no abastecimento
de Maceió.
A história do bairro é marcada pelo
desenvolvimento de indústria têxtil (foto 1), que durante décadas proporcionou
serviços e equipamentos urbanos à população. A fábrica passou por período de
auge, chegando à grande empregadora, com a maioria dos trabalhadores morando em
suas vilas operárias. Com o decorrer de crise econômica de âmbito nacional, o
quadro mudou, provocando alterações na vida da população, que sofreu ruptura na
cultura operária. Sem a atuação da fábrica, a população precisou, e ainda
precisa, de mecanismos alternativos que proporcionem geração de emprego, renda
e precisa, também, de intervenções para melhoria na qualidade de vida e no
desenvolvimento local.
Um
informe sócio-econômico
O bairro parece isolado da cidade
(foto 2), devido às condições de relevo, sendo cercado por resquícios de mata
(foto 3), Lagoa Mundaú e área ocupada do tabuleiro. A indústria não mais atende
à demanda por emprego e existem raras opções para a geração de renda; o desemprego
é um dos principais problemas do local. Existe um pequeno comércio voltado às
necessidades mais imediatas da população, como padarias, mercadinhos, mas que
não têm porte de empregador.
A população apresenta baixa escolaridade
(2007). Os homens apresentam maior nível no ensino médio, mas quanto ao superior,
as mulheres sobressaem-se. A atividade profissional da maioria dos
entrevistados não demanda alta escolaridade. A maior parte da população está
desempregada e, no caso das mulheres, o problema se agrava.
O número de aposentados é elevado, o
que representa alta taxa de pessoas idosas. A metade dos profissionais entrevistados
é diarista e recebe salário no final do mês. Cerca de 15% trabalham
informalmente. A maioria recebe salário mínimo. Renda, educação e trabalho são
variáveis-chave para o entendimento de um local.
Um pouco sobre o cotidiano
Evidentemente, estes dados não
detalham a condição de Fernão Velho, mas são suficientes para acentuar um
cotidiano fundado na baixa renda, repetindo-se na condição do local, o que
seria esperável face à pirâmide de renda e distribuição de benefícios sociais
da produção. Sabemos das dificuldades de implementar políticas que visem
alterar este quadro, mas é urgente que sejam tomadas providências no sentido de
refazer a condição do bairro, sendo responsabilidade do poder público com a
pressão democrática da comunidade. Voltamos a dizer que estamos diante de um
quadro geral, do qual Fernão Velho é parte, mas nada se explica, com relação à
mudança, apenas por este motivo, que pode gerar uma interminável justificava.
Para que se note a distorção
existente no urbano de Fernão Velho, é suficiente saber que parte dos
entrevistados não identifica os espaços públicos do bairro, (fotos 5 e 6), haja
vista o alto percentual dos que dizem não haver praças no local, possivelmente
decorrendo da descaracterização, levando à incapacidade de nominação. No
entanto, e possivelmente acentuando o seu caráter ainda rurbano, tem-se uma característica
marcante de “cidade do interior”, a praça é efetivamente utilizada. Há um jogo
entre reconhecer e utilizar, pelo significado que o cotidiano dá ao espaço, o
que não desejamos explorar no momento
.
É
necessário destacar a falta de detalhamento de opinião da população para os
assuntos relacionados ao mercado de trabalho, o que talvez redunde dos
trabalhos de campo, sendo um item de difícil elaboração. A maioria dos que
responderam disse serem os estudos e a formação profissional a maior
dificuldade para o ingresso. Nisto esclarecem que não é suficiente ter acesso à
escola, mas ter, também, a devida habilitação para responder ao mercado. Outro
problema, está na deficiência do transporte público. Isto é uma indicação de
problema a ser visto a curto prazo. É possível que esteja sendo enunciada a
condição de bairro-dormitório. Por outro lado, aparece o fato estrutural da falta
de ofertas de emprego. Como se nota, há um complexo de situação identificado
desde a capacitação até problemas rigorosamente estruturais, mas existem,
também, indicações imediatas para intervenção.
Quando perguntado sobre as áreas de
interesse quanto ao tipo de trabalho que desejava, a grande maioria aparentemente
não teve resposta (41,4%), mas o silêncio pode ser significativo, indicando
para diversas hipóteses, dentre elas o fato de que aceitariam qualquer emprego.
O importante não é em que se trabalha, mas ter emprego. Isto fica clara numa
pequena porção de respostas que parecem confirmar a regra: 6,9% disseram ser
qualquer uma.
Em
torno do desenvolvimento
Diversas são as formas de conceituar
e mensurar o desenvolvimento, haja vista a infinidade de tipos e subtipos de definições.
O conceito de desenvolvimento envolve vários aspectos, e deve ser aplicado ao
conjunto da sociedade. Refere-se, principalmente, a mudanças sociais. Segundo
Souza (2003, p. 100), desenvolvimento é “um processo de mudança para
melhor, um processo incessante de busca de mais justiça social e melhor
qualidade de vida para o maior número possível de pessoas, ou seja, que leve em
conta os interesses legítimos da sociedade”.
Para que o desenvolvimento aconteça
de forma continuada, sustentada e includente é necessário que haja investimentos
em capital humano e social. Entretanto, para que se torne viável, é necessário
o crescimento econômico, de modo a facilitar a abertura
de novos postos de trabalho e a distribuição da renda. Segundo Franco (2002, p.
41–42) “a capacidade de apropriação e multiplicação da renda é
função dos níveis de capital humano e capital social existentes numa dada
sociedade”.
No entanto, ainda de acordo com
Franco (2002, p. 62), do ponto de vista do desenvolvimento, “o principal elemento do capital humano, o que distingue e caracteriza o
humano como ente construtor de futuro e, portanto, gerador de inovação, é a
capacidade das pessoas de fazer coisas novas, exercitando sua imaginação”.
Neste sentido, o autor afirma que não bastam, ou não são suficientes, os níveis
de escolaridade. É necessário que haja mobilização, desenvoltura, habilidade
para tornar real aquilo que se planeja e
para isso é imperativo, também, ter capacidade empreendedora.
É imprescindível desenvolver nas
pessoas a capacidade de sonhar e lutar por esses sonhos; criar ambientes
favoráveis à inovação, para que seja possível gerar desenvolvimento. Contudo, é
essencial que a formação de capital humano seja simultânea ao incentivo do desenvolvimento
de capital social. O capital social é entendido como o ambiente propício à geração
de desenvolvimento. A formação de redes horizontais de confiança, constituídas
a partir de valores compartilhados e objetivos comuns,
é o elemento basilar para o desenvolvimento do capital social.
Promover autonomia e justiça social
devem ser as diretrizes de implementação de políticas; só pode haver quebra no ciclo
de reprodução de desigualdades se houver intervenções sistemáticas no
comportamento dos agentes que interagem em termos de competição e colaboração,
conforme se depreende de Franco (2002).
Conhecer as características e
particularidades da comunidade é de importância ímpar para uma proposta de mudança,
além de que, distinguir potencialidades a partir das peculiaridades endógenas
da sociedade é o primeiro passo para alavancar um processo de desenvolvimento.
A partir disso, a manutenção dos recursos disponíveis e a própria preservação
das características do lugar devem ser conquistas da população local, à medida
que as pessoas forem incorporando o processo de mudança e se sentindo
responsáveis pelo seu habitat. Sachs
(1993, p. 39) afirma que é importante e urgente “enfatizar na capacidade
da população local de agir de forma não-agressiva em relação ao meio ambiente,
uma vez que tenham sido removidos os obstáculos que os impedem de ter uma visão
a longo prazo a respeito da preservação de sua base de recursos”.
As estratégias devem ser tomadas
como os meios disponíveis para explorar as condições favoráveis de uma dada
região, em vista dos objetivos almejados. Para isso é fundamental que existam
parcerias, convênios, sejam estabelecidos acordos, de maneira que os atores
sociais se envolvam em torno de um objetivo comum. Dentre as inúmeras
estratégias que podem ser consideradas para promover o desenvolvimento, vamos
pontuar algumas de maior relevância para Fernão Velho, tendo em vista as suas
particularidades.
É fundamental que se trabalhe a
mudança respeitando a organização local e integrando de modo efetivo, o bairro
na economia urbana de Maceió. Como vimos, é essencial a participação
comunitária na gestão do processo, de modo a que o desenvolvimento aconteça com
a sociedade civil e não de cima para baixo, dando ao estado poder absoluto
escondido na justificativa de um planejamento.
Umas delas refere-se à implantação
de
infraestrutura proporcionando melhoria da qualidade de vida à comunidade. Além
disso, a preservação dos recursos naturais do bairro – que se encontra inserido
numa APA – depende fundamentalmente da infraestrutura urbana local.
Investimento em saneamento básico, por meio de um sistema de coleta de esgoto
sanitário, é indispensável para a sustentabilidade da própria lagoa Mundaú. A
drenagem urbana impede a contaminação da água da chuva pelas águas servidas e
vice-versa. O serviço de coleta de lixo pode ser otimizado através da coleta
seletiva, contribuindo para a conservação do meio ambiente e gerando renda para
o bairro.
Melhorias no transporte coletivo
público são essenciais. Aprimorar a acessibilidade e mobilidade urbana são
fatores necessários para facilitar o acesso ao bairro e atrair visitantes. O
transporte ferroviário é outro item que merece ser explorado, em razão do grande
potencial que tem o lugar, com belas paisagens. A segurança oferecida ao bairro
pelo sistema de policiamento é outro aspecto que merece destaque. Oferecer
segurança ao morador e, principalmente, ao visitante-turista é um item
necessário para que cada vez mais pessoas procurem o lugar.
Com relação aos equipamentos
urbanos, é imprescindível que haja incremento na oferta dos serviços de
educação e saúde. Sabendo do baixo nível de escolaridade da população e das
deficiências das instituições de ensino, só pelo investimento no setor será
possível reverter esse quadro. A educação colabora para elevar a autoestima da
população, gerar novas formas de trabalho e renda.
Sabendo do grande potencial
turístico da área, com suas belezas naturais e características da comunidade,
este é um mercado promissor para o setor de serviços. E ainda tendo em vista o
atual incentivo do governo do Estado para o setor de turismo na própria cidade
de Maceió, o bairro pode se apresentar como mais um ponto de atração. O setor
privado deveria ser o maior interessado, e seria necessário que se realizassem
parcerias e /ou convênios, de maneira que houvesse investimentos efetivos no
bairro.
O bairro está inserido numa APA –
APA do Catolé e Fernão Velho – e conta com áreas de mata em seu território. Na
área são realizadas trilhas, entretanto, não existe nenhuma fiscalização ou
controle. A exploração deste recurso natural, de forma sustentável e
consciente, pode ser uma fonte de renda para a população, além de ser uma
maneira para difundir a conscientização ambiental sobre a área, por meio de
parcerias com as instituições de ensino.
O bairro de Fernão Velho já possui
uma cooperativa, a Cooperativa de Produção e Confecções de Fernão Velho (foto
4). No entanto, em entrevista com o seu presidente, este afirmou que se
identifica na comunidade a falta de ânimo pela atividade. Sabendo das vantagens
do trabalho cooperativo pela geração de trabalho e renda para a população, e em
vista da tendência do bairro para esse setor, achamos importante o
fortalecimento do cooperativismo local, por meio de palestras, seminários e /ou
cursos para esclarecer a população sobre os benefícios da atividade.
Promover a capacitação da população
de Fernão Velho é de uma importância ímpar para que se abram novos caminhos
para a comunidade. E conhecendo as potencialidades do bairro, tais como a presença
da indústria têxtil, a Cooperativa de Produção e Confecções de tecidos e o
atrativo turístico do lugar, essas devem ser as áreas prioritárias para a
implantação de cursos de capacitação, que podem vir a ser cursos
profissionalizantes.
Podem ser desenvolvidos no bairro
cursos de corte e costura, cursos para a prática cooperativa, cursos
profissionalizantes de guia turístico, entre outros. Os cursos deveriam ter por
objetivo capacitar e informar a população sobre a importância de preservar a
cultura local, mostrando-lhes que é possível, a partir das características do
próprio bairro, promover o desenvolvimento local.
Para a realização dos cursos, que poderiam
atender ao mercado com o foco para a demanda interna do bairro, seria
necessário o apoio do Governo do Estado e da Prefeitura Municipal de Maceió, os
quais, em parceria com os Serviços Nacionais de Aprendizagem Comercial e
Industrial – SENAC e SENAI –, ofereceriam a capacitação à população.
Referências
FRANCO,
Augusto de. Pobreza &
desenvolvimento local. Brasília: ARCA Sociedade do Conhecimento, 2002.
SACHS,
Ignacy. Estratégias de transição para o século XXI. In: BURSZTYN, Marcel (Org.). Para
pensar o desenvolvimento sustentável. São Paulo: Brasiliense, 1993.
SOUZA,
Marcelo Lopes de [1963]. ABC do desenvolvimento
urbano. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003.